SARS-CoV-2 em águas residuais urbanas

08 mai 2020

A implementação de uma forte política de contenção da transmissão do novo coronavírus permitiu a Portugal minimizar o impacto deste novo agente patogénico sobre a comunidade, ganhando um tempo crítico na preparação de novas estratégias para enfrentar o desconhecido e assegurando simultaneamente o acesso a um serviço de saúde pública de excelência.

A transmissão do novo coronavírus só estagnará através de uma terapia precoce eficaz, indisponível hoje, ou através do desenvolvimento de uma imunidade de grupo e vacinação frequentemente discutida na comunidade científica. Esta última implica que uma grande parte da população Portuguesa venha a ser infectada.

Esta fase inicial de contenção deu origem a uma segunda etapa em curso, cujo risco depende da capacidade de conjugar as regras de distanciamento social e a tentativa de restabelecer progressivamente as actividades e os comportamentos sociais comuns.

O nosso sucesso na condução desta segunda etapa depende essencialmente da competência em apurar assertivamente o risco para a saúde pública e da implementação de uma decisão fundamentada. Na actual situação de transmissão sustentada do vírus, urge definir novas estratégias de médio e longo prazo, adicionando métodos e modelos complementares para a detecção atempada de clusters de infeção emergentes e o acompanhamento da evolução dos existentes, tendo em consideração, a sua dimensão, especificidade e variabilidade demográfica, por forma a proteger os mais vulneráveis.

Foi recentemente publicado um artigo na revista The Lancet, Gastroenterology & Hepatology intitulado SARS-CoV-2 in wastewater: potential health risk, but also data source. O artigo não só sugere que as águas residuais potencialmente contaminadas com o novo coronavírus podem vir a representar um risco para a saúde pública, mas destaca também a possibilidade de testar as águas residuais urbanas para a presença do RNA viral como forma de identificar e acompanhar a evolução dos grandes clusters de infeção a uma escala macroscópica.

A perspectiva de contaminação das águas residuais urbanas em larga escala com o novo coronavírus vem alertar para a necessidade de uma atenção especial no controlo dos processos de descontaminação das águas residuais e o teste regular da água potável canalizada para a presença do RNA do novo coronavírus.

Um planeamento criterioso de testes ao sistema de transporte e tratamento das águas residuais, tendo em vista a detecção de RNA do novo coronavírus, pode vir a ser usado na identificação e no acompanhamento da evolução dos clusters de infecção como parte integrante de uma metodologia desenvolvida a diferentes escalas complementares. Uma definição estratégica dos locais e periodicidade de testes por amostragem em diferentes níveis da hierarquia da rede nacional de transporte de águas residuais, do edifício aos principais pólos de tratamento ou zonas da cidade, pode orientar uma intervenção informada. O teste de águas residuais poderá ser um complemento aos testes individuais, endereçando os grandes clusters onde os testes individuais não são exequíveis, revelando os clusters de indivíduos assintomáticos, através de um método que minimiza os riscos inerentes ao contacto pessoal na recolha de amostras biológicas, constituindo uma fonte de informação complementar no combate ao novo coronavírus no atual contexto de pandemia.

Cientista autor deste texto e tradução: Jorge Cardoso

Artigo científico: SSARS-CoV-2 in wastewater: potential health risk, but also data source

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