Recombinação e forte seleção purificadora na origem do SARS-CoV-2

25 jun 2020

A origem do SARS-CoV-2, causador da atual pandemia que vivemos, é ainda um mistério, em parte porque o nosso conhecimento fundamental sobre a diversidade natural dos coronavírus é ainda limitado. A origem de um agente patogénico pode ser revelada através da comparação da informação contida no seu genoma com a de outros genomas conhecidos. Este artigo mostra que o genoma do SARS-COV-2 não só tem 96.3% de semelhança genética com coronavírus de nome RaTG13 isolados dos morcegos em 2013, mas também tem uma região que é geneticamente semelhante a coronavírus encontrados nos pangolins. Ou seja, o agente da covid-19 nos humanos parece ser um híbrido.

Um dos sinais da hibridização, que em genética se chama de recombinação, ocorre na zona do genoma que codifica para a proteína spike —  este componente da coroa que dá o nome ao vírus é também a proteína que, ligando-se ao receptor ACE2, permite ao vírus entrar nas células humanas e infectá-las. O sinal de recombinação localiza-se especificamente na zona do genoma que codifica para a região de ligação da proteína spike ao recetor. Nesta zona, o genoma do SARS-COV-2 deixa de ser parecido com o dos vírus dos morcegos assemelhando-se ao dos vírus dos pangolins. Assinaturas genéticas como esta revelam que a evolução dos antepassados do SARS-COV-2 é marcada por muita recombinação, e que eventos de recombinação no gene spike podem levar a alterações consideráveis na sua capacidade de ligação às nossas células, como indicam as previsões feitas usando técnicas de modelação de biologia estrutural. Por outro lado, o nível de variação causada por mutações neste gene indica que a variação é restringida, o que é compatível com a importância do gene spike e de outras regiões do genoma para a biologia do vírus. Sabemos que quando um gene perde a sua função pode sofrer todo o tipo de alterações sem efeito e a diversidade observada não é restringida. A restrição da diversidade do gene spike significa assim que este gene está sujeito a forte seleção.

Em suma, este artigo de genómica comparativa, juntamente com a literatura anterior sobre os coronavírus e publicações mais recentes que avaliaram a função de várias formas da spike que estes vírus têm na sua diversidade natural, sugere que recombinação e seleção que purifica os vírus de mutações desvantajosas são dois processos comuns na sua história evolutiva. Estes processos devem ser tidos em conta ao considerar a origem e evolução da pandemia atual e a prevenção de epidemias futuras.

 

Cientista autor do texto: Isabel Gordo

Tradução: Joana Saraiva

Artigo científico: Emergence of SARS-CoV-2 through recombination and strong purifying selection

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